Copiado do blog Cláudio Nunes
27/07/2013 - 06:32
Por que o papa Francisco fascina tanto os jovens?
Intuem que Francisco não é um ator nem um hipócrita
“O jornalismo é o exercício diário da inteligência e a prática cotidiana do caráter.” Cláudio Abramo.
(El País 25/07/2013)
Ninguém mais duvida. Francisco agrada aos jovens, católicos ou não.
Mais ainda, os eletriza, como se pôde comprovar ontem nas ruas do Rio,
onde pudemos ver, com um nó na garganta, o pequeno Fiat do papa
materialmente invadido por uma maré de jovens peregrinos que vieram para
a Jornada Mundial da Juventude.
A pergunta é por que esse fascínio de jovens que, ao mesmo tempo, como
revelam as pesquisas, exigem da Igreja muito mais do que o próprio papa
lhes oferece.
Os jovens hoje estão desencantados com quase tudo, preocupados com o
futuro. Eles mesmos são vítimas, por exemplo, de uma violência
assassina. Entre os 50 mil homicídios com armas de fogo cometidos por
ano no Brasil, 80% são de jovens.
Dizem que não creem nos mais velhos. Menos ainda nos políticos. Dizem
que são fundamentalmente egoístas e hedonistas. E sobretudo consumistas.
Que não têm valores.
E chega Francisco, bem mais velho, quase um avô para eles, um papa
exigente que os põe em guarda contra o "fascínio do provisório", quer
dizer, a ânsia de consumir e possuir; que lhes diz que são a porta por
onde entra o futuro do mundo, mas lhes propõe um futuro no qual "menos é
mais". Chama-os a despojar-se do provisório e fugaz em busca do que
permanece, da essência.
Há algumas chaves, apresentadas pelos próprios jovens presentes no Rio,
que são significativas para entender esse paradoxo. Alguns desses
jovens dizem que gostam do papa Francisco porque "não representa um
papel. É o que diz". Como sabem disso? Intuem.
Gostam dele porque é diferente dos personagens do poder que eles
conhecem e abominam. Dizem que Francisco "simplifica" as coisas, que
para ele menos é mais.
Talvez porque os jovens sentem com força o verme do consumismo e do
efêmero, sentem-se fascinados pela simplicidade de seus gestos e
palavras.
Cansados das hipocrisias e do esbanjamento dos homens no poder,
sentem-se atraídos e enlouquecidos vendo Francisco percorrer as ruas do
Rio em um carro utilitário, sem blindagem, com a janela aberta. Veem-no
sem medo de morrer, algo que excita os jovens.
E apreciam que Francisco seja um papa com "corpo". Não é um espírito
nem um anjo. Não tem medo de beijar nem de abraçar. Não rejeita o
contato dos corpos.
Intuem que Francisco não é um ator nem um hipócrita, que não exige o
que não é capaz de fazer, que é consequente com suas palavras. Veem-no
despojado, carinhoso, terno e ao mesmo tempo severo, a começar por si
mesmo.
Quando soube que queriam contratar o chefe de cozinha de um luxuoso e
mítico hotel do Rio, o Copacabana Palace, informou que preferia que as
freiras lhe cozinhassem arroz, feijão e pão de queijo, bem à brasileira.
Gostam desse seu olhar, escreveu ontem um jovem, "que o olha e parece vê-lo por dentro".
Os jovens sabem que Francisco já foi como eles: teve namorada, pensou
em se casar antes de decidir seguir sua vocação. Mais ainda, já
sacerdote, durante um casamento apaixonou-se perdidamente por uma garota
e passou, como ele mesmo contou a seu amigo, o rabino Skorka, uma
semana sem poder dormir. Havia até pensado em deixar o hábito. Resistiu e
preferiu seguir sua vocação. Isso também agrada aos jovens.
"Parece-nos sincero, não é hipócrita", dizia um jovem espírita que veio
de fora do Rio para conhecer Francisco: "Embora eu não seja católico,
gosto desse senhor tão simples apesar de ser papa", disse a um repórter
do jornal "O Globo".
E, finalmente, os jovens sentem que Francisco acredita neles, no que
representam no mundo. Acredita, como ele mesmo disse, nessa "capacidade
de surpresa" que os jovens costumam oferecer.
Em tempos de descrença geral, enquanto grupos de adultos fazem ritos
aqui na rua para "desbatizar-se" ou exibir seu ateísmo, uma boa surpresa
é que centenas de milhares de jovens de tantos países e línguas
diferentes se apaixonaram por um papa que lhes pede que se despojem da
casca do supérfluo para sentir a vibração do que permanece e vale a pena
saborear.
Sobretudo, disse-lhes o papa, vale a pena "fazer algo pelos outros".
Parece pouco, mas é esse pouco proposto como mensagem condensada que
está conquistando a simpatia e o carinho dessa juventude, sobre a qual
ele disse ontem que "devemos abrir espaço" para que possa "crescer e
amar em liberdade".